segunda-feira, 4 de julho de 2011

Quem vai amarrar o gato?

Um antigo mosteiro chinês, no alto da montanha de Song Chan, era o centro de uma paz absoluta, e monges de toda a china procuravam aquele monastério tão tradicional e reservado. Todos os dias o monge ia para o templo para a primeira meditação matinal. Este momento era sagrado para os monges, e o silêncio deveria sempre ser respeitado. Um dia um gato entrou no templo e passeou por todo o espaço enquanto o monge tentava fazer suas orações. Sua concentração diminuiu. Ele tentava concentrar-se nas orações mas o gato atraía sua atenção, pedindo carinho.

Sob a ótica de conduta dos monges, eles deveriam ser piedosos com o animal, e nunca enxotariam o gato do mosteiro ou lhe fariam algum mal, durante alguns dias o monge tentou deixar o gato livre, mas ele estava mesmo muito atrapalhado e perdia a concentração na hora de fazer as orações. Então resolveu tomar uma providência. Amarrava o gato durante os períodos de meditação e o soltava logo após a prática matinal.

Este procedimento foi feito durante muito tempo, resolvendo o problema de falta de concentração durante as meditações. Outros monges viam aquilo e repetiam a ação, amarrando o gato durante as orações. Os anos se passaram, o monge mestre morreu, e mesmo assim continuavam a amarrar o gato diariamente durante os momentos de meditação matinal, mais alguns anos se passaram e o gato morreu, e os monges preocupados, resolveram encontrar outro gato para colocar no lugar do antigo, e o novo gato continuou sendo amarrado diariamente.

As décadas se passaram, e novas gerações de monges e mestres mantiveram o hábito diário de amarrar o gato, que acabou se tornando um importante ritual naquele famoso e respeitado templo, e a esta altura, ninguém mais sabia o porquê de amarrar o gato, mas justamente por isso, aquele ritual se tornou muito importante, sendo uma característica famosa daquele monastério.

Monges veteranos cobiçavam a importante função de amarrador de gatos, manuais foram criados com as normas e procedimentos de todo o processo para amarrar o gato, ensinando como pegar o gato, que tipo de corda e mordaça utilizar, quantas voltas com a corda deveriam ser dadas, que tipo de nó poderia ser feito, enfim, uma verdadeira enciclopédia do ritual de como amarrar e amordaçar o gato.

O tempo passou, e vários grupos de estudiosos começaram a dedicar suas vidas a estudar os manuais e a origem do ritual sagrado de amarrar o gato. Estes grupos se dividiram, e começaram a divergir sobre várias questões, várias interpretações surgiram, e correntes de seguidores começaram a defender teorias diversas sobre o ritual sagrado, estas divergências geraram conflitos internos, e as origens e processos do ritual passaram a ser o ponto de discórdia entre os dois grupos formados.

Um dos pontos principais de divergência era que, um dos grupos acreditava que somente gatos brancos poderiam ser amarrados, pois o branco simbolizava a pureza da alma e a evolução espiritual, o outro já defendia que qualquer gato poderia ser amarrado e que isto não fazia diferença nenhuma e resolveu ir embora do famoso monastério para fundar uma nova ordem, que daria continuidade ao ritual da forma que achavam correta, sendo assim, estes dois grupos passaram a divergir constantemente e não mantiveram mais contato, pois o primeiro era acusado de ser radical e o segundo de ser extremamente liberal.

Após a separação, novas correntes começaram a se formar, e um terceiro grupo começou a surgir, divulgando uma teoria que unia as duas linhas divergentes, eliminando seus defeitos e absorvendo suas qualidades.

O antigo monastério da montanha de Song Chan foi aos poucos se dividindo, e hoje nenhuma das linhagens existe mais, e o ritual de amarrar o gato caiu no esquecimento.

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Este conto é muito interessante para evidenciar o que acontece em muitas empresas e instituições, é muito comum ver pessoas que cumprem normas e procedimentos totalmente sem sentido e sem fundamentos, que simplesmente são feitos porque alguém que já os fazia antes, e terminam sendo os fatores geradores da estagnação. Estagnação das organizações e também das pessoas que vivem aceitando tudo, dizendo "amém" pra tudo, sem questionar.



Vanessa Versiani
http://www.diferencie-se.com.br